Após a denúncia feita ontem pelo jornal O Globo e aprofundada com mais detalhes pelo SCemPauta sobre o contrato do Governo do Estado para serviços de telemedicina com uma empresa do Piauí, novas informações vieram à tona, reforçando o clima de controvérsia em torno da contratação. O processo de compra, conduzido em sigilo absoluto pelo Centro de Informática e Automação do Estado de Santa Catarina (Ciasc), resultou em uma contratação sem licitação, no valor de R$ 547 milhões.
Segundo algumas fontes, a situação vazou quando servidores da Secretaria de Estado da Saúde, preocupados com pressões para acelerar o processo, procuraram orientação junto a outros órgãos do estado. “Eles disseram que estavam sendo pressionados diariamente, mas temiam ser responsabilizados legalmente caso assinassem e surgissem problemas depois. Tinham medo de serem presos”, revelou uma fonte.
O contrato de telemedicina, mediado pelo Ciasc, praticamente cria uma estrutura complexa de prestação de serviço, que alguns especialistas chamariam de “quarteirização” no serviço público de saúde em Santa Catarina. A Secretaria de Estado da Saúde contratou o Ciasc, que, por sua vez, contratou a empresa Integra Saúde Digital Telemedicina, a qual, surpreendentemente, não é a proprietária do software. A Integra é apenas licenciada da Portal Telemedicina Ltda., uma empresa paulista, que detém a tecnologia original.
Essa configuração explica cláusulas do contrato que limitam o acesso do estado à tecnologia e à propriedade do sistema após o término do contrato, colocando Santa Catarina em uma posição de dependência contínua. Em outras palavras, ao fim do contrato, o governo precisará continuar com a Integra ou negociar diretamente com a Portal para manter o sistema, o que acarretará novos custos.
Inversão do processo
Outro detalhe crítico revelado pelos documentos aos quais o SCemPauta teve acesso indica que a demanda não partiu originalmente do estado, mas da própria Portal, que ofereceu a solução. Em 24 de outubro do ano passado, o vice-presidente de Tecnologia do Ciasc, Vânio Rodrigues, enviou uma mensagem para uma pessoa identificada como “Sidnei”, pedindo a abertura de um processo de parceria para atender à demanda da Secretaria de Estado da Saúde em telemedicina. A mensagem detalha: “Considerando que a empresa Portal Medicina & Saúde já nos procurou e apresentou uma solução para atender a essa demanda da SES, solicito que inicie o processo de parceria, se a mesma atender os requisitos.”
A ação contraria a ordem para processos dessa natureza, pois a demanda deveria ter partido da Secretaria de Saúde. Com a demanda originada internamente, o Ciasc, ao ser contratado, deveria desenvolver o serviço ou buscar alternativas no mercado. Essa inversão fere as diretrizes de transparência e questiona a dispensa de licitação, já que não foi feita uma análise de mercado mais ampla.
Vinte e um dias após o pedido de Vânio Rodrigues para iniciar o processo, a Integra Saúde Digital, empresa do Piauí licenciada da Portal, abriu uma filial em Florianópolis, em 14 de novembro. Apenas três dias depois, a empresa entregou sua proposta comercial para a contratação, levantando questionamentos sobre a rapidez e coincidência.
Venda para municípios
Fontes também relatam que a intenção é que o serviço seja vendido a municípios catarinenses via Ciasc, sem licitação, amparado pela Lei das Estatais, que permite processos simplificados em casos de inovação. Contudo, especialistas destacam que a telemedicina não configura inovação, uma vez que o serviço já é amplamente praticado, inclusive por empresas de qualidade no estado.
Vale destacar que o Ciasc é comandado por Moisés Diersmann, ex-prefeito de Luzerna e ex-secretário de Estado da Administração na gestão de Jorginho Mello, sendo uma figura da total confiança do governador.
SC em Pauta
Empresas pequenas são contratadas pelas propostas baratas que oficializam, isso da margem para desvios e outras artimanhas.