Médico discute o Pacto da Saúde

 

Sra. Olivete,

 

Continuando o tema sobre o Pacto Pela Saúde da Presidente Dilma, alguns pontos precisam ser explorados. Inicialmente o pacto deve ter a plena participação da população, assim como nossas leis, as normas do SUS devem ser cobradas ponto a ponto. Explico. Sabemos que o Brasil é recordista em câncer, doenças cardiovasculares, diarreia e trauma por acidentes automobilísticos assim como também vivemos uma epidemia continuada de dengue e obesidade, com essas situações enchendo hospitais, postos de saúde e consumindo recursos que se não modificadas as causas básicas, serão sempre insuficientes.

Onde a população entre nesta história? É simples, prevenção! Os principais fatores de risco para o câncer e doença cardiovascular são o tabagismo, alimentação e falta de atividade física. De que adianta encher de médicos e aparelhos de Radiologia para identificar o câncer de pulmão se o indivíduo continua fumando, e o pior, um novo grupo está assumindo os principais lugares nas estatísticas que são as mulheres. Cada dia mais mulheres começam a fumar. Logo estarão também assumindo as primeiras colocações nos internamentos por doenças crônicas. Portanto, se a população não participar diminuindo o tabagismo, alimentando-se corretamente, reduzindo a quantidade de sódio (sal) na dieta, reduzindo a ingestão de frituras, conservantes, excesso de carboidratos (açúcares), veremos que as epidemias atuais de doenças crônicas serão ainda piores. É a mesma situação do caminhoneiro que reclama de buracos na estrada, mas quando pode leva uma carga superior ao permitido para ganhar um pouco a mais e consequentemente vai estragar a estrada que trás seu ganha pão. Outro aspecto importante e que pouco se fala é na medicação. É de conhecimento de todos que a falta de qualidade na medicação utilizada na assistência básica é uma realidade. Faltam estudos de bioequivalência, vigilância nos processos de industrialização, troca de medicamentos em farmácias, prescrição de medicamentos por profissionais e pessoas sem o conhecimento adequado dos efeitos colaterais e indicações do fármaco, prejudicando o processo de cura e agravando a saúde do doente.

Poderíamos combinar com a Excelentíssima Senhora Presidente que o foco na saúde não  é encher de médicos e sim levar os ensinamentos da autoescola para a sala de aula. Quem sabe ensinando as gerações futuras que o motociclista deve ter cuidado ao trafegar nas ruas, que os veículos devem respeitar as velocidades, ter sua manutenção em dia, conseguiremos modificar as estatísticas das emergências onde sessenta por cento dos atendimentos referem-se a acidentes automobilísticos e destes disparado são com motocicletas, fazendo aparecer uma nova classe de brasileiros, os sequelados e inválidos por acidentes de trânsito.

Também poderíamos combinar com nossos gestores de saúde e administrados para colocar o Sistema de Saúde em pleno funcionamento. Pouco vai adiantar colocar um médico estrangeiro em um município onde cem por cento da população não possui agua tratada ou esgoto para seus dejetos. O nome já  diz tudo: Saneamento Básico. Isto é fundamental, é básico! Em qualquer lugar do mundo desenvolvido sabemos que as principais causas de diarreia são a falta de esgoto e agua tratada. Assim como poderíamos deixar de desviar bilhões com corrupção e sobrando recursos para investir em programas de industrialização e melhoria de renda da população que permitissem aos pais comprarem sapatos para seus filhos a fim de não deixarem que pisem no chão sujo e infectado por esgoto nas favelas do Brasil a fora. Também não terá fim a epidemia de dengue enquanto o esgoto correr a céu aberto, tivermos valas e lagoas de dejetos expostas, a população lançar lixos em rios que depois serviram para fornecer água

Imagino um posto de saúde ideal para atendimento da seguinte forma: Um médico com salário, equipamentos para diagnóstico, enfermeira, técnicos de enfermagem, nutricionista, assistente social, psicólogo, dentista, professor de educação física e engenheiro sanitário. Vimos que pouco poderá fazer o médico se a população não parar de fumar. Um dos principais motivos do tabagismo é a ansiedade e dificilmente conseguiremos fazer o fumante parar com seu vício se não ajudarmos a reduzir os motivos de sua ansiedade. Chamemos os psicólogos para participar. Da mesma forma a obesidade, alterações no colesterol, sedentarismo, diabete poderiam ser mais bem controlados com a participação da população e dos profissionais acima citados agindo no bairro, perto das casas, entrando nos lares, desta forma reduzindo a demanda pelo serviço médico, retirando a sobrecarga nos atendimentos.

Portanto, não  cabem a uma única classe os problemas enfrentados na Saúde Pública no Brasil. Todos tem uma participação. Desde os gestores e administrados, aos empresários que fabricam os medicamentos, os pacientes que não tomam os remédios corretos, os viciados em cigarro, os motoristas imprudentes, os professores das futuras gerações… Não culpem o médico, por favor. O problema é mais amplo. Se fizéssemos a tarefa de cada indivíduo corretamente poderíamos viver melhor. É correto fazer passeata para pedir saúde, transporte adequado, segurança… Mas vamos olhar nossos atos antes de pedir o sacrifício dos outros. Vamos cobrar dos gestores corrupção zero para poder contratar os profissionais acima descritos com salários dignos e ajudar a população a intender seu papel na promoção da saúde. Vamos cobrar que forneçam remédios conforme prescritos e na forma e qualidade que merecemos. Vamos ser parceiros na busca de uma saúde plena. Finalmente, o médico não é o vilão! Somos profissionais que sofrem estigmas por estarmos na linha de frente e com condições de apontar os problemas colocando o dedo literalmente na ferida. Não deixem o Governo desviar o foco de seus anseios. Cobrem a corrupção zero, participem da promoção da saúde e tenham-nos como parceiros.

Obrigado.

Paulo Cesar da Costa Duarte – Cirurgião Vascular

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