Ação contra prefeito e vice de Bocaina é improcedente

Veja na íntegra a sentença:

 

Em anexo todas as informações referentes ao Autos n. 904-40.2012.6.24.0093  
 
Assunto: Ação de Investigação Judicial Eleitoral 
 
Representante: Ministério Público Eleitoral 
 
Representado: Luis Carlos Schmuler 
 
Advogado(a): Rafael Pelegrim (OAB/SC 25.786) 
 
Representado: Valmir Martins Luciano 
 
Advogado(a): Rafael Oneda (OAB/SC 22.989) 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Vistos. 
 
 
 
Cuida-se de Ação de Investigação Judicial Eleitoral ajuizada pelo Ministério Público Eleitoral em face de Luiz Carlos Schmuler e Valmir Martins Luciano, já qualificados, candidatos eleitos, respectivamente, aos cargos de prefeito e vice-prefeito de Bocaina do Sul, nas eleições municipais de 2012, visando à apuração de supostos atos caracterizadores do abuso de poder econômico e político. 
 
Em sua exordial acusatória (fls. 02/07), relata o douto Representante do Ministério Público Eleitoral que ¿Após a publicação da matéria sobre a pré-candidatura da Coligação “Mudar? Sim, Nós Podemos” , verificou-se que o investigado VALMIR MARTINS LUCIANO passou a distribuir atestados e requisitar exames pelo Consórcio Intermunicipal de Saúde (CIS/AMURES), sendo que as consultas foram realizadas em seu consultório particular, localizado na rua Ludgero Buss Oening, n. 93, bairro Centro, no município de Bocaina do Sul-SC. Consoante documentação anexa percebe-se que tal conduta é irregular, pois as requisições de exames são expedidas no ato da consulta, no local de atendimento determinado pelo CIS/AMURES, no caso, na sede do Consórcio. Ademais, consta do Ofício 505/2012 que o médico VALMIR MARTINS LUCIANO atende às segundas-feiras, a partir das 8h, na sede do CIS/AMURES, localizada à rua João de Castro, n. 367, bairro Centro, no município de Lages-SC. Constata-se que as condutas configuram abuso de poder e que influenciaram de forma significativa no pleito, tiveram grande repercussão e comprometeram a lisura e legitimidade das eleições, motivo pelo qual este Órgão do Ministério Público Eleitoral investiga LUIZ CARLOS SCHMULER e VALMIR MARTINS LUCIANO”. 
 
Ao final, pugna pela procedência do feito para que sejam: 1) declarada a inelegibilidade por oito anos dos representados; 2) cassados os diplomas concedidos aos candidatos eleitos Luiz Carlos Schmuler e Valmir Martins Luciano; 3) declarada a nulidade dos votos atribuídos aos candidatos eleitos eleitos Luiz Carlos Schmuler e Valmir Martins Luciano; e 4) condenado o representado Valmir Martins Luciano dando-o como incurso na sanção prevista no art. 73 da Lei n. 9.504/1997 (fl. 06).  
 
Acompanha a peça exordial os documentos de fls. 08/32. 
 
Regularmente notificados, os representados apresentaram suas defesas. Preliminarmente, o representado Luiz Carlos Schmuler sustenta: 1) a inépcia da peça exordial, sob o argumento de que a acusação não faz sequer uma imputação objetiva dos fatos e do agente e muito menos descreve eventual benesse recebida pelo demandado; 2) a incompetência do Juízo Eleitoral para apreciar a matéria, porquanto a exordial descreveria mera infração administrativa e ao Estatuto de Ética Médica; 3) a sua ilegitimidade passiva, face a inexistência de quaisquer indícios de que teria participado, presenciado ou anuído com qualquer conduta narrada na inicial. 
 
No mérito, alega que: 1) o Ministério Público Eleitoral não individualizou os fatos dos quais teria participado, prejudicando, desta forma, a sua defesa; 2) os fatos narrados na inicial em hipótese alguma configurariam infração à legislação eleitoral, mas tão-somente irregularidades administrativas; 3) não há demostração de que os atos perpetrados desequilibraram o pleito; 4) a pretensão punitiva pretendida pelo Ministério Público Eleitoral viola os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade. Outrossim, impugna os documentos que acompanham a inicial, sob o argumento de que não fazem parte do articulado na peça portal. 
 
Ao final, requer sejam reconhecidas as preliminares arguidas ou, acaso ultrapassadas, no mérito seja julgada totalmente improcedente a presente representação. 
 
Por sua vez, o representado Valmir Martins Luciano de igual forma arguiu, em sede preliminar, a inépcia da peça exordial e a incompetência do Juízo Eleitoral para apreciar a matéria, utilizando-se dos mesmos argumentos expendidos pelo primeiro representado. 
 
No mérito, sustenta que: 1) a conduta tida por irregular e abusiva pelo Ministério Público Eleitoral é, na realidade, conduta normal, que em nada pode ser comparada ao abuso de poder político ou econômico; 2) a acusação apenas menciona, sem qualquer indício de prova nesse sentido, que os atendimentos fora do Consórcio tiveram o condão de influenciar o rumo das eleições majoritárias em Bocaina do Sul; 3) a maioria das pessoas atendidas no período abrangido pela denúncia são há anos por ele atendidas; 4) que não há qualquer demonstração de que os atendimentos tiveram conotação política e que desequilibraram o pleito eleitoral. De igual sorte, impugna os documentos que acompanham a inicial, sob o argumento de que não fazem parte do articulado na peça portal. 
 
Ao final, requer sejam reconhecidas as preliminares arguidas ou, acaso ultrapassadas, no mérito seja julgada totalmente improcedente a presente representação. 
 
Realizada audiência de inquirição das testemunhas arroladas pela acusação e pelas defesas (termos de fls. 102-114), ocasião em que restaram rejeitadas todas as preliminares arguidas pelos representados. 
 
No prazo de que trata o art. 22, inciso VI, da Lei Complementar n. 64/90, foram juntados os documentos de fls. 119-987. 
 
Em sede de alegações finais, manifestou-se o Parquet pela improcedência total dos pedidos formulados na preludial acusatória, sob o entendimento de que a instrução processual não logrou demonstrar o alegado abuso de poder (fls. 1008-1010). 
 
Em suas alegações finais, ambos os representados asseveraram que não há, nos autos, quaisquer elementos de prova a corroborar a tese acusatória, razão porque requerem a improcedência total do feito (fls. 82/86). 
 
Vieram-me os autos conclusos. 
 
Suficientemente relatados. 
 
DECIDO. 
 
 
 
A Ação de Investigação Judicial Eleitoral em apreço tem por objeto a apuração de condutas supostamente abusivas do poder econômico, perpetradas pelos representados Luiz Carlos Schmuler e Valmir Martins Luciano, eleitos, respectivamente, prefeito e vice-prefeito de Bocaina do Sul, durante as eleições municipais de 2012. 
 
Mais precisamente, noticia o Ministério Público Eleitoral, com base em denúncia encaminhada pela coligação “Bocaina Não Pode Parar” , que o representado Valmir Martins Luciano, utilizando-se da sua condição de médico, distribuía atestados médicos e requisitava exames por intermédio do Consórcio Intermunicipal de Saúde (CIS/AMURES) com fins eleitorais, inclusive e principalmente em consultas realizadas no seu consultório particular. 
 
Pois bem. 
 
Inicialmente, faz-se necessário esclarecer que não compete à Justiça Eleitoral dizer se a utilização de guias de requisição de exames e papéis timbrados do Consórcio Intermunicipal de Saúde (CIS/AMURES) em consultórios médicos particulares constitui irregularidade administrativa ou não. Tampouco se os atestados médicos concedidos pelo médico Valmir Martins Luciano aos servidores da Prefeitura Municipal de Bocaina do Sul eram realmente devidos e necessários. 
 
O que verdadeiramente interessa para esta Justiça especializada é saber se o médico Valmir Martins Luciano condicionava a concessão de atestados médicos e requisições de exame ao voto dos pacientes na chapa composta por ele e pelo representado Luis Carlos Schmuler. 
 
Nessa toada, verifico que não exsurge do conjunto probatório carreado aos autos qualquer elemento de prova apto a comprovar que o representado Valmir tenha incorrido na prática das condutas a ele imputadas. Por outras palavras, não há prova alguma de que o representado Valmir tenha distribuído atestados médicos e requisições de exames em troca de votos. 
 
A esse propósito, extraio os seguintes excertos do depoimento prestado pela testemunha Vanessa Baumgarten (fls. 107/108) : 
 
 
 
[…] que o representado Valmir sempre atendeu em qualquer horário, inclusive atendeu a mãe do depoente em casa, mais de uma vez; que o representado Valmir sempre manteve o mesmo procedimento, antes e depois das eleições; que não se tornou mais simpático pelo fato de estar concorrendo a cargo eletivo; que nunca o representado Valmir pediu voto da depoente; que não tem conhecimento de que ele fazia atendimentos ou encaminhamentos de exames com o objeto de angariar votos; que não tem conhecimento se o representado Luís Carlos se aproveitava da condição de médico de seu candidato a Vice encaminhando pessoas para atendimento profissional com o objeto de obtenção de votos; […]. 
 
 
 
No mesmo sentido é o depoimento da testemunha Patrícia Elizani da Silva Passos (fls. 109/111): 
 
 
 
[…] que o representado Valmir não alterou a sua postura no período eleitoral, sendo que continuou agindo como sempre fazia; […] que é paciente do representado Valmir em torno de 20 anos; que ele é o médico de sua família; que ele já lhe atendeu nesta cidade de Lages no consultório que ele aqui mantém, e também já atendeu a depoente na casa da depoente; que o representado Valmir é profissional solícito e facilmente é encontrado, inclusive nos finais de semana; que em nenhum momento, ainda que indiretamente, foi solicitado pelo representado voto em seu favor, ou condicionado atestado ou solicitação de exame em troca de voto; […]. 
 
 
 
Já do documento de fls. 23/24, subscrito pelo presidente do CIS/AMURES, extrai-se que entre os meses de abril e novembro de 2012 o médico Valmir Martins Luciano realizou apenas 3 (três) consultas pelo referido consórcio de saúde, quantidade esta absolutamente irrisória para a caracterização de qualquer tipo de abuso. 
 
De igual sorte, a extensa documentação acostada às fls. 119/986 – fotocópias da ficha funcional da servidora Patrícia Elizani da Silva Passos, das portarias de afastamento de servidores municipais de Bocaina do Sul no períodode 30/06/2011 a 30/12/2012 e de todos os atestados médicos apresentados por servidores nos anos de 2011, 2012 e 2013 -, não possui o condão de demonstrar a prática de captação ilícita de sufrágio ou qualquer forma de abuso de poder.  
 
Nesse talante, urge destacar que de um total aproximado de 250 (duzentos e cinquenta) atestados médicos apresentados à Prefeitura de Bocaina do Sul por seus servidores nos anos de 2011, 2012 e 2013, apenas 24 (vinte e quatro) foram expedidos pelo médico Valmir Martins Luciano; destes, apenas 5 (cinco) foram concedidos durante o período eleitoral de 2012. 
 
Aliás, a análise da referida documentação infirma por completo a alegação feita pela ex-prefeita Marta Regina Góss, em depoimento prestado nos presentes autos (fls. 104/106), no sentido de que ¿na condição de Prefeita de Bocaina ficou impressionada com a quantidade de atestados médicos e solicitação de exames subscritos pelo representado Valmir Martins” . 
 
Não foi outra a conclusão do digníssimo Promotor de Justiça Eleitoral, que, em sede de alegações finais, bem pontuou: 
 
 
 
Através da documentação juntada verificou-se que há uma grande quantidade de atestados médicos, emitidos não só pelo representado como também pelos demais profissionais que atendem no município de Bocaina do Sul, não sendo possível vislumbrar que os atestados eram fornecidos apenas no período eleitoral com o fim de obter votos mas durante todo o ano. 
 
 
 
E conclui: 
 
 
 
Assim, constatamos da análise do bojo probatório, que não restou comprovado excesso em sua função de médico, bem como não ficou demonstrado a capacidade de afetar a igualdade de oportunidades entre os candidatos nas eleições em comento. 
 
 
 
Dessarte, não havendo no caderno processual quaisquer elementos de prova que possibilitem concluir que o representado Valmir Martins Luciano distribuiu atestados médicos e requisições de exame em troca de voto, a única solução que se impõe é a improcedência da presente actio. 
 
À vista do exposto, nos termos da fundamentação, tenho por bem julgar improcedente a presente Ação de Investigação Judicial Eleitoral, forte no art. 23 da Lei Complementar n. 64/90. 
 
Sem custas.  
 
P.R.I. 
 
Lages, 06 de maio de 2013. 
 
 
 
 
 
 
 
Antônio Carlos Junckes dos Santos 
 
Juiz Eleitoral

Despacho em 04/04/2013 – Protocolo 28.155/2013 Juiz ANTONIO CARLOS JUNCKES DOS SANTOS

 

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